O cumprimento dos contratos durante e no pós pandemia do Covid-19 Coronavírus .

Em função da situação de emergência em saúde pública, alguns contratos, inevitavelmente, serão descumpridos. Ainda que as partes envolvidas não sejam as responsáveis pela inviabilidade de executar o que havia sido acordado, correm o risco de entrar em um imbróglio jurídico.

Muito embora ainda não haja posicionamento definitivo dos Tribunais e dos Poderes Legislativo e Executivo sobre os efeitos jurídicos oriundos das medidas de prevenção adotadas para diminuir os impactos da Covid-19, o entendimento mais plausível seria o de caracterizar a pandemia como caso fortuito, considerando as medidas drásticas que já estão sendo tomadas e que ainda estão por vir.

A teoria da imprevisão surgiu da fusão da cláusula rebus sic stantibus e do elemento interpretativo imprevisão, no qual essa se torna elemento protagonista. A teoria da imprevisão funciona como regra de justiça do manter o equilíbrio dentro das relações contratuais, sendo conservante da comutatividade contratual.

Por motivos éticos e morais, procura-se uma relação contratual saudável onde deve viger a proporção entre a vantagem auferida e o sacrifício equivalente. Assim pela teoria da imprevisão em face dos contratos comutativos e de execução diferida, a rebus sic stantibus que determina que o contrato apenas tenha força obrigatória enquanto persistirem os suportes fáticos que lhes serviram de fundamento.

Código Civil determina em seu art. 393 que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

O artigo 479 do Código Civil apenas concede ao réu a faculdade de manter o contrato em plano revisional, desde que concorde em modificar equitativamente as cláusulas contratuais. A revisão contratual é prestigiada pelo princípio da conservação dos contratos e da função social dos contratos.

Enunciado 366: O fato extraordinário e imprevisível causador de onerosidade excessiva é aquele que não está coberto objetivamente pelos riscos próprios da contratação. Referência Legislativa:  Norma: Código Civil 2002 – Lei n. 10.406/2002; ART: 478.

Isso não significa que a liberdade contratual fique superada pois a autonomia privada, só pode ser exercida dentro dos limites de valores fundamentais da Constituição Federal  o que exige, respeito, lealdade, eticidade e socialmente dos contratantes.

A cláusula geral da função social dos contratos viabiliza que a obrigação de realização de parcelamento de débitos. Enfim, a hermenêutica contratual deve convergir com a constitucional, principalmente no que tange aos direitos, fundamentais como a dignidade da pessoa humana, do trabalho e da livre iniciativa e da solidariedade. Consagra o fim econômico do contrato de modo justo e equânime, e, não ignora a liberdade de contratar e o pacta sunt servanda.

Portanto, em face a pandemia diante da quebra da base do negócio jurídico é possível promover a revisão contratual no sentido de tornar exequível o contrato e o cumprimento obrigacional.

Referências:

Manual de Responsabilidade Civil. Volume único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018.

SCHEREIBER, Anderson; TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando; LEITE, Marco Aurélio Berra; DELGADO, Mário Luiz. Código Civil Comentado. Doutrina e Jurisprudência. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

TRT-3 considera constitucional lei que o autoriza homologar acordos trabalhistas Extrajudiciais

 

Foi se valendo desse mecanismo que um trabalhador e a ex-empregadora, uma empresa do ramo fotográfico, buscaram a homologação de um acordo no valor de R$ 5,5 mil em cinco parcelas.

Fonte: TRT3

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Reprodução: pixabay.com

 

Uma das novidades trazidas pela chamada reforma trabalhista foi a ampliação da competência da Justiça do Trabalho para decidir quanto à homologação de acordo extrajudicial (artigo 652, alínea “f”, da CLT). Foi se valendo desse mecanismo que um trabalhador e a ex-empregadora, uma empresa do ramo fotográfico, buscaram a homologação de um acordo no valor de R$ 5,5 mil em cinco parcelas.

Só conseguiram em segunda instância, quando o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) acolheu recurso da empresa e homologou o acerto. Em primeiro grau, o juiz extinguiu o processo sob o argumento de que esse trecho da reforma trabalhista é inconstitucional e, portanto, a Justiça do Trabalho não teria interesse processual na causa.

No recurso, o relator no TRT-3, o juiz convocado Ricardo Marcelo Silva, criticou a decisão de seu colega da primeira instância. Para ele, o magistrado interpretou o artigo 114 da Constituição Federal, que descreve as competências da Justiça do Trabalho.

Para o juiz de 1º grau, os acordos trabalhistas devem ser precedidos de litígio, o que não ocorre nas conciliações extrajudiciais enviadas à Justiça do Trabalho para homologação. Na sentença, considerou a alínea ‘f’ do artigo 652 da CLT inconstitucional, ao fundamento de tornar a Justiça do Trabalho um ente homologador de acordos alheio à sua missão constitucional.

Vantagens da solução extrajudicial

O relator do recurso discordou da interpretação: “Além de patológica, na medida em que propugna pela necessidade de intervenção judicial para solucionar quaisquer tipos de conflitos trabalhistas, independentemente dos níveis de complexidade e de controvérsia envolvidos, viola os princípios da fraternidade e da segurança jurídica e o direito à liberdade, previstos nos arts. 3º e  da Constituição”. No seu modo de entender, as referências da Constituição a “ações” e “controvérsias” não possuem o significado limitado de litígio.

“Estas expressões decorrem apenas da necessidade do legislador constituinte de indicar as matérias passíveis de análise por este ramo especial do Poder Judiciário. Elas devem ser interpretadas à luz do princípio do livre acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da Constituição)”, explicou. Conforme ponderou, a se admitir interpretação tão restritiva, a Justiça do Trabalho não poderia executar acordos judiciais, termos de ajuste de conduta ou termos de conciliação firmados perante a Comissão de Conciliação Prévia, na forma do artigo 876 da CLT, pois em todos estes casos a decisão executada decorreria de prévio acordo.

Na visão do relator, o legislador foi sábio ao editar a Lei nº 13.467/2017, pois concedeu às partes o poder de, elas próprias, solucionarem diretamente seus conflitos. Ele enxerga a vantagem de o acordo extrajudicial homologado em juízo possibilitar, em casos de inadimplemento, a execução judicial com a mesma força dos demais títulos executivos judiciais. Para ele, o trabalhador não sai necessariamente prejudicado, principalmente se o empregador, como no caso, é uma empresa individual limitada, de pequeno porte, que se dedica à prestação de serviços de produção de fotografias e de filmagens em festas e eventos, nos moldes previstos no contrato social.

Caso concreto

No caso, o julgador chamou a atenção para o fato de o contrato de trabalho ter durado aproximadamente 10 meses (de 01/02/17 a 16/12/17) e o empregado ter sido dispensado sem justa causa. Conforme observou, os problemas financeiros da empresa inviabilizaram o pagamento de verbas trabalhistas, que só será possível mediante as cláusulas fixadas no acordo. A conclusão alcançada foi a de que a justiça propugnada pela sentença só elevaria a litigiosidade e, não necessariamente, proporcionaria o efetivo pagamento de valores mais expressivos que o fixado no acordo.

Doutrina de Grau – “É preferível aplicar o Direito ao caso concreto, mesmo que isto implique em não fazer Justiça, nos moldes propugnados pela sentença recorrida”, pontuou, citando no aspecto o artigo do Ministro Eros Grau: “Os juízes aplicam o Direito, não fazem justiça! Vamos à Faculdade de Direito aprender Direito, não a justiça. Esta, repito, é lá em cima. Apenas na afirmação da legalidade e do Direito positivo a sociedade encontrará segurança e os humildes, proteção e garantia de seus direitos de defesa. A independência judicial é vinculada à obediência dos juízes à lei. Os juízes, todos eles, são servos da lei. A justiça absoluta – aprendi esta lição em Kelsen – é um ideal irracional; a justiça absoluta só pode emanar de uma autoridade transcendente, só pode emanar de Deus.” (Juízes interpretam e aplicam a Constituição e as leis, não fazem justiça).

Nesse contexto, o relator deu provimento ao recurso para afastar a extinção do processo, reconhecendo a constitucionalidade do artigo 652, f, da CLT, a competência da Justiça do Trabalho e o interesse processual das partes na homologação de acordo extrajudicial. Também deu provimento ao recurso para homologar o acordo extrajudicial celebrado, nos moldes da petição anexada ao processo, entendendo que as partes comprovaram os requisitos previstos nos artigos 855-B e seguintes da CLT.

Processo: 0010308-45.2018.5.03.0038

Uber é condenado a indenizar por perda de voo de passageiro após erro no trajeto

Motorista seguiu uma rota totalmente diversa dos outros dois motoristas que conduziram os familiares do recorrido.

A 1ª turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, por maioria, manteve decisão que condenou a empresa Uber ao pagamento de danos morais e materiais decorrentes da perda de voo de um passageiro em razão de erro no trajeto pelo motorista do aplicativo.

Na ação contra a empresa, passageiro alegou que solicitou por meio do aplicativo, um motorista para levá-lo ao aeroporto, sendo que seu pai e seu cunhado solicitaram mais dois carros pelo mesmo aplicativo. Segundo o autor, os três carros seguiam juntos até que o motorista que o levava errou o caminho e caiu em um demorado congestionamento, fato que fez o autor perder o voo. Por fim, alegou que, em razão da perda do voo, sofreu prejuízos, pois teve que remarcar a passagem e, consequentemente, cancelar três pacientes que tinha agendado para aquele dia.

Em 1º grau, o Uber foi condenado a pagar R$ 78, para reparar a remarcação do voo; R$ 1.010,00 que o autor deixou de receber pelas consultas comprovadamente marcadas e canceladas e R$ 1 mil a título de indenização por danos morais.

Ao analisar o recurso da empresa, a 1ª turma, no entanto, manteve a sentença. Por maioria, os magistrados reconheceram que o motorista realmente errou o caminho para o aeroporto e mantiveram o entendimento da condenação por danos morais e materiais.

Processo: 0739507-14.2017.8.07.0016

TJ-SP aplica teoria do desvio produtivo ao condenar empresas por cobrança indevida

Conforme essa tese, tempo perdido pelo consumidor na tentativa de solucionar um problema que não deu causa lhe acarreta dano indenizável.

Vem ganhando força no Tribunal de Justiça de São Paulo a aplicação da teoria do desvio produtivo do consumidor: conforme a tese, o tempo perdido pelo cliente na tentativa de solucionar um problema que não deu causa lhe acarreta dano indenizável.

Consumidores têm acionado o Poder Judiciário em busca da reparação do dano que resulta na injusta perda de tempo, com embaraços, dificuldades, protelações, demora no atendimento, consertos sabidamente falhos e outras práticas comerciais abusivas de fornecedores de produtos e serviços.

A 30ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP por exemplo, em fevereiro, condenou uma empresa de telefonia a pagar R$ 10 mil de indenização por cobranças indevidas de um serviço não contratado. Os desembargadores reconheceram que o condicionamento do plano pós-pago ao “combo digital” constitui venda casada, prática abusiva vedada pelo Código de Defesa do Consumidor (artigo 39, I).

“Quantos serão os consumidores que efetivamente buscam o Poder Judiciário para reverter a conduta ilícita da requerida? A ré confessa que todos os planos pós-pagos estão com a referida cobrança, já declarada ilícita. Evidente que o sistema ofertado favorece o ilícito lucrativo”, afirmou a relatora, desembargadora Maria Lúcia Pizzotti.

A empresa Telefônica (Vivo) argumentou que o plano apresenta com destaque a cobrança dos “serviços de terceiros”, consistente na oferta de Vivo Go Read, Kantoo e NBA , “parte integrante e indisponível” do plano.

Os desembargadores, contudo, discordaram: “O argumento de que tais serviços estão inseridos no contrato, sem cobranças a mais, não prospera. Fosse meramente elucidativo, o serviço não estaria destacado da cobrança; pouco importa que o valor do plano outrora prometido ao cliente seja o mesmo. Seja para elidir aumento na fatura, alterar o regime de tributação, motivos contábeis ou quaisquer outras razões, fato que a ré cobra por serviços que o consumidor não aderiu condicionando o plano pós-pago de forma indissociada ao ‘combo digital’”.

Pizzotti reconheceu ainda dano moral e aplicou a tese do desvio produtivo do consumidor, pela qual a condenação deve considerar também o desvio de competências do indivíduo para a tentativa de solução de um problema causado pelo fornecedor, com sucessivas frustrações diante da ineficiência e descaso deste.

Origem

A tese foi criada pelo advogado Marcos Dessaune na obra Desvio Produtivo do Consumidor, lançada em 2011 pela Editora Revista dos Tribunais. Um dos pioneiros no TJ-SP a aplicar a teoria foi Fábio Podestá, juiz em segundo grau na Subseção I de Direito Privado,  também professor universitário e doutrinador.

Julgado pela 5ª Câmara de Direito Privado em novembro de 2013, o caso se tratava de problemas que uma consumidora teve com uma máquina de lavar defeituosa. A consumidora acabou recebendo uma indenização de R$ 5 mil pelo tempo perdido para tentativa de solução do problema.

Em março, a 19ª Câmara de Direito Privado condenou um banco e uma empresa de crédito por cobranças indevidas em contrato de mútuo. O autor da ação estava em dia com os parcelamentos da dívida mas, por erro do banco, passou a ser insistente cobrado pelos réus, até mesmo quando estava em viagem internacional de férias, o que fez com que tivesse gastos altos com roaming.

O autor da ação continuou sendo importunado com ligações telefônicas e até carta de cobrança e, apesar de muitas tentativas, não conseguiu resolver o impasse extrajudicialmente. O juiz de primeiro grau rejeitou pedido de danos materiais e morais, porém a sentença acabou reformada pelo TJ-SP.

“O episódio descrito lhe trouxe expressivo sofrimento íntimo, digno de proteção jurídica, já que foi injustamente cobrado, por débito regularmente satisfeito, durante longo período. Experimentou desgaste, perda de tempo, angústias e aflições”, afirmou o relator Ricardo Pessoa de Mello Belli.

Belli concluiu que “o desvio produtivo caracteriza-se quando o consumidor, diante de uma situação de mau atendimento, precisa desperdiçar o seu tempo e desviar as suas competências de uma atividade necessária ou por ele preferida para tentar resolver um problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável”.

Dessa forma, a câmara reconheceu o dano moral e arbitrou a indenização em R$ 5 mil, “conforme os padrões utilizados por esta turma julgadora para hipóteses análogas, sobretudo à luz da técnica do desestímulo”.

Volkswagen deve indenizar em todo Brasil donos de Amarok por software fraudulento. Empresa também pagará R$ 1 milhão de danos morais coletivos.

Cada proprietário do carro Amarok deve receber R$ 54 mil de danos materiais e mais R$ 10 mil de danos morais pela instalação no veículo de software fraudulento que burla a emissão de gases poluentes.

A condenação da Volkswagen foi proferida pelo juiz de Direito Alexandre de Carvalho Mesquita, da 1ª vara Empresarial do Rio, que fixou também o pagamento de dano moral coletivo no valor de R$ 1 mi.

A sentença foi dada em ação da Abradecont – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor e do Trabalhador.

Fraude global

A Associação narrou que, em setembro de 2015, a empresa admitiu que um dispositivo que altera resultados sobre emissões de poluentes não foi usado apenas nos EUA, mas em 11 milhões de veículos a diesel em todo o mundo, em modelos de várias marcas pertencentes ao grupo.

O magistrado rechaçou a alegação da Volks de que os danos seriam hipotéticos, pois a simples existência de um dispositivo que manipule resultados de emissão de gases poluentes já configura “ato não só ilegal, mas imoral e desleal ao meio ambiente e ao consumidor”, tendo em vista devido ao fato de “os consumidores terem sido vítimas de uma fraude comercial de proporção global”.

Para o julgador, tal atitude fere o princípio da boa-fé e configura infração relativa à poluição, disposta no art. 71 do decreto 6.514/08.

“A ré ao implantar o software, sem que os consumidores tivessem ciência, já foi uma afronta ao princípio da informação adequada que os fornecedores devem prestar aos consumidores. Além disso, os consumidores da Amarok foram vítimas de propaganda abusiva e método comercial desleal, visto que o público não sabia o real potencial poluidor do automóvel. Com isso, a saúde de todos também está sendo ameaçada, visto que o veículo emite mais poluentes do que a ré afirma emitir.”

No Brasil, são mais de 17 mil proprietários do modelo Amarok. O valor total das indenizações ultrapassa R$ 1 bi.

O juiz também condenou a Volkswagen a prestar informações claras, seguras e completas sobre todas as características dos veículos Amarok, de todos os anos de fabricação, comprovando, pormenorizadamente, através de documentação técnica hábil, quais os modelos que estão equipados com o dispositivo manipulador e quais não estão, a fim de que sejam submetidos à perícia, não se prestando a tal fim superficiais informações e chamadas para “recall” sem maiores explicações, como as que foram recentemente divulgadas pela empresa, sob pena de multa diária de R$ 50 mil.

Processo: 0412318-20.2015.8.19.0001